Sus Nosso de Cada Dia - Memórias de Um Martim Pensador

Sus Nosso de Cada Dia - Memórias de Um Martim Pensador

"Médico muito requisitado, atendi uma criança com grave insuficiência respiratória, em um inverno muito frio, ao fim da tarde. – Por que a senhora não veio antes? – perguntei revoltado à mãe. – Porquê de manhã o senhor só atende doentes particulares, os que podem pagar a consulta. No começo da tarde, atende os convênios, e eu só tenho o INPS. – ela respondeu a um envergonhado pediatra. Eu havia visto aquela senhora pela madrugada, ao passar por uma fila do INPS, ela agasalhava a criança com um cobertor igual a uma bandeira do Grêmio, a mesma que ela utilizava ao entrar no meu consultório no fim da tarde. Minha boa formação médica me permitiu dispensar o Raio X de imediato, e internar a pequena menina na sala de emergência do hospital. Os estertores em meu estetoscópio indicavam uma grave uma pneumonia, e a percussão de meus dedos sobre seu tórax, que já havia áreas com pus consolidado. A palidez azulada da pele nos dedos mostrava um quadro muito ruim. Instalei eu mesmo seu soro intravenoso, com penicilina cristalina pingando na veia, e uma máscara com oxigênio contínuo enquanto tomava sua veia. Depois internei-a em uma enfermaria com uma tenda de oxigênio aquecida. Contra as normas do hospital, permiti a presença da mãe ao seu lado, lembrando de nosso último diálogo. – Doutor, na vizinhança só eu tenho INPS. " ALCENI GUERRA - Médico e Ex-Ministro da Saúde do Brasil.

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