Primeiro foi o choque do petróleo, em 1973. Mais recentemente, os atentados de 11 de setembro, em 2001. Nas últimas décadas, o mundo árabe surgiu com força no noticiário, ocupando espaços muito além de seu tradicional conflito com Israel e levando o cidadão comum a voltar-se para essa parcela da Humanidade concentrada no Oriente Médio. Como no século XIX, quando a região começou a ser lentamente incorporada à esfera de influência européia, uma certa curiosidade orientalista voltou a pairar no ar. E é no melhor estilo da escola do orientalismo que o ex-diplomata britânico Mark Allen brinda o leitor com Árabes ? um curto e bem-alinhavado estudo introdutório sobre a alma desse povo que constitui pouco menos de 5% dos habitantes do planeta, mas que tem estado no centro das atenções.

Mesclando suas três décadas de experiência diplomática no Oriente Médio, onde serviu em embaixadas britânicas entre 1973 e 2004 e viajou extensamente, com sua erudita formação na prestigiosa Universidade de Oxford, Allen desvenda o caráter e a cultura árabes com um toque de observação pessoal só possível a quem conhece o objeto de estudo numa convivência mais íntima e próxima. Daí também o tom geral da obra, que flui mais como uma conversa direta e objetiva do autor com o leitor do que como um denso tratado acadêmico. Allen soube usar de sua erudição e vasto conhecimento sobre o tema sem torná-los excessivamente pesados.

O livro do ex-diplomata é também um alerta contra avaliações maniqueístas ocidentais sobre os árabes, advertência útil em tempos em que a violência do terrorismo islamista deixa o mundo sobressaltado. Mesmo porque, avisa ele, a resposta à pergunta "o que é um árabe?" é múltipla "e tem significado coisas diversas em diferentes momentos da História". Árabes é certamente fruto dessa tentativa honesta de Allen, um ocidental sem raízes orientais, de entender o mundo daqueles povos de forma desprovida de qualquer preconceito. A todo momento, o autor contrapõe a herança cultural e as estruturas mentais ocidentais às dos árabes, para que do confronto se compreendam as diferenças que certamente existem, mas que não chegam a separar em definitivo os dois mundos. O retrato que sai do livro é de uma mesma Humanidade com mais de uma face.

Obra de leitura rápida e enriquecedora, Árabes toca nos principais temas que servem de pano de fundo para o entendimento do tema: religião, mulheres, honra, família, poder, política, comunidade, modernidade ? nada escapa do olhar observador e analítico de Allen, que junta numa única trama os fios soltos desse tecido multicultural de povos das duas dezenas de países que compõem o mundo árabe atual. O resultado final desse mergulho do ex-diplomata britânico na cultura árabe nada fica dever, em qualidade narrativa e rigor acadêmico, a estudos clássicos do gênero como as obras de Albert Hourani e Edward Said.